O site IGay, local voltado ao público gay do portal IG, fez uma corajosa entrevista com o deputado Jean Wyllys. Por mais que para mim Wyllys seja apenas mais um folclórico deputado que só enxerga para suas constituências, não é preciso Wyllys esborçar mais do que três frases para que possamos cabalmente decretar que ele é mil vezes mais articulado que o inofensivo e risível deputado Marco Feliciano.
Entrevista toda aqui (reparem nos comentários): http://tvig.ig.com.br/noticias/politica/quem-demoniza-o-modo-de-vida-gay-vai-terminar-criminalizando-a-cervejinha-do-fim-de-semana-diz-jean-wyllys-5138d3d81063db07b800002a.html
O primeiro ponto da entrevista foi a questão do casamento gay. Wyllys disse que, sendo o Estado separado da igreja desde 1889, não há motivos não-religiosos para que se impeça dois homossexuais de se casarem e isso incorre numa incoerência. Na visão do deputado, levando em consideração que heterossexuais casam-se e divorciam-se a todo momento, não haveria razão lógica para que não se estenda esse direito aos homossexuais.
[caption id="" align="aligncenter" width="733"] Wyllys, sobre as difamações que tem sofrido.[/caption]
O problema do deputado é que muitas vezes ele se serve de um discurso maniqueísta, considerando algumas pessoas como "do bem" ( que ele chama de progressistas ) e outras "do mal" ( que ele chama de fundamentalistas ). Para ele, se um religioso discorda dele na questão do casamento gay, só pode se tratar de um fundamentalista religioso; se o religioso não se opõe a ele nesses pontos, ele os vê como religiosos legítimos e progressistas. Ao fazer essa conveniente separação, Wyllys associa a visão de mais de 50% dos brasileiros a de fundamentalistas religiosos.
Mas o que seria um fundamentalista religioso? No Ocidente, o termo fundamentalista é usado para descrever fiéis que leem a bíblia ao pé da letra. No cristianismo, fundamentalistas são geralmente mais loucos do que necessariamente perigosos. Prova disso é que na primeira página da bíblia está escrito que deus fez dia e noite, só depois criando o sol. Logo, um fundamentalista não conseguiria entender nem os primeiros versículos do livro de Gênesis, pois como poderia haver dia sem que houvesse sol? Milagre?
O problema é que Wyllys usa o termo fundamentalismo indiscrimadamente a favor da causa dele. Se os evangélicos e católicos, que o deputado afirma que misturam religião e Estado, são de fato fundamentalistas, por que motivo eles não defendem que se apedreje adúlteras e que se mate fornicadoras - como está escrito no Velho Testamento que estes "fundamentalistas" creem. A resposta é simples: porque eles não são fundamentalistas e não usam os textos bíblicos ao pé da letra - e os o fazem, não defendem que o Estado faça isso.
Wyllys acredita que a maioria dos cristãos brasileiros são favoráveis aos direitos LGBTs, mas infelizmente não é isso que a ciência estatística diz. Quando analisamos as pesquisas podemos observar que os cristãos ainda são resistentes ao assunto. A última pesquisa da Datafolha que foi lançada nesse mês aponta que apenas 41% dos católicos são favoráveis a união gay; espíritas são 64%e adeptos da umbanda, 53%. Portanto, quando Wyllys diz que a maioria dos cristãos são favoráveis aos direitos LGBTs, ou está mentindo ou está tomando uma licença poética.
[caption id="" align="aligncenter" width="1600"] Com excessão de uma pesquisa da CNT/Sensus de 2012, todas as outras pesquisas mostram que o brasileiro é contrário ao casamento gay. Logo, podemos presumir que esta também é a posição dos 90% de cristãos que compõe o Brasil.[/caption]
Wyllys afirmou na entrevista que a bancada "fundamentalista" se une aos conservadores laicos da bancada ruralista e da bancada de empresários para tentar repelir os direitos dos gays no congresso. Ele afirma que esse conservadores laicos da bancada ruralista e empresarial são contra os direitos dos LGBTs simplesmente por serem "contrários mesmo às diferenças". O deputado chega a dizer que esses grupos PAGAM pessoas para fazer comentários de ódio nas redes sociais e nas matérias de jornais. Lúdico!
O deputado ainda apontou seus canhões para os televangelistas que são contrários ao casamento gay. Na visão dele, as tvs, que são consessões públicas, não podem ceder espaço para pastores difamarem a comunidade gay e para arrebanharem votos. O deputado ainda reclama das igrejas em que seus fiéis votam em pessoas indicadas pelos seus pastores. Nesse ponto, a voz do parlamentar está alinhada com a do resto da população.
O ex-BBB também resolveu dizer quais são os partidos que estão do lado da causa gay: PV, PT, PSB, PC do B e até o PSDB; do outro lado estaria PP, PR, PEN e PSC. O deputado baiano ainda se usou do medo para tentar mostrar que extremismos estariam porvir:
"E o congresso vai reparar que ele está anacrônico. Não adianta o fundamentalismo crescer se a sociedade está se transformando. E a sociedade vai entender que se começa com a repressão do modo de vida gay, pode terminar com a repressão de outras formas de vida. As pessoas vão notar que a cervejinha deles de final de semana está ameaçada".
O deputado depois é ainda mais direto no uso de seu discurso de alerta:"Começa criminalizando, demonizando o modo de vida gay, vai acabar criminalizado a cervejinha de fim de semana. Vai acabar criminalizando o modo de vida como um todo". Jean Wyllys, para o site IGay.
Não é de hoje que políticos dizem que seus adversários ameaçam a toda a população para depois se apresentarem como os salvadores da pátria. O mais estranho é que esse discurso de medo venha de um político tão articulado. Talvez ele não saiba que opiniões com essas podem gerar preconceito contra os religiosos como um todo.
Eu nunca ouvi falar de nenhum projeto que venha a proibir a cerveja. O que a bancada evangélica e católica lutam é pela proibição de venda de cerveja dentro dos estádios na Copa do Mundo.
O que os evangélicos/católicos na câmara de fato vêm lutando para criminalizar e demonizar é a pedofilia. Eu não me surpreenderia se fosse um deputado evangélico que fizesse uso do medo para atiçar seus eleitores, pois a PL 122 realmente pode criminalizar o modo de vida de toda uma parcela pacífica e ordeira da população que crê que a homossexualidade seja um pecado.
O deputado Wyllys deveria tentar causar menos polêmicas e legislar para o seu estado, o Rio de Janeiro. No dia crucial da importante votação sobre a perda dos royalties dos estados produtores de petróleo, Jean Wyllys nem em Brasília estava, preferindo ir a uma manifestação a favor da legalização da prostituição. Wyllys vê a sua própria presença no congresso como uma vitória, mas pode esquecer que seus erros podem ser associados a toda a sofrida comunidade gay.
Todos temos o direito de nos expressarmos, mas não vai ser com o uso de uma mensagem de medo, belicista e maniqueísta que o deputado vai alcançar ganhos para a causa gay. Toda vez que ele chama religiosos de fundamentalistas, apenas pelo fato deles crerem na bíblia, ele não ganha nada a não ser mais inimigos para sua causa. Quando ele é injusto com outros, não pode reclamar de injustiças contra ele. Se ele difamar outros de racistas e homofóbicos, não pode reclamar que o difamem.
[caption id="" align="aligncenter" width="300"] Dois deputados evangelicos, pertencentes a bancada que Wyllys chama de fundamentalista, dialogando com o polêmico deputado. Cadê a homofobia? Será que rolou uma cervejinha?[/caption]
Não vale a pena jogar uma parte da sociedade contra o resto apenas por causa de suas convicções religiosas. O resultado desse discurso inflamado é uma sociedade mais sectária, com mais preconceito e com mais munição para os preconceituosos se sentirem no direito de cometer maldades. O que o deputado deveria estar incitando era a criação de um diálogo amplo com todos os setores da sociedade, até aqueles que ele chama de fundamentalistas. O que ele faz atualmente não somente levanta muros na nossa sociedade, mas também destrói pontes.
[…] também usa do medo para tentar jogar a população contra seus inimigos. Em entrevista ao IG, chegou a insinuar que deputados religiosos iriam proibir a cerveja. Por mais qu…. O que os deputados religiosos apóiam é a lei seca para evitar mortes no trânsito – lei […]
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